domingo, 10 de novembro de 2013

A QUESTÃO DA ACENTUAÇÃO GRÁFICA NO ACORDO ORTOGRÁFICO*





Roberta Farias Paiva**

RESUMO
O presente artigo tem por finalidade analisar a questão da acentuação gráfica no acordo ortográfico. O intuito desse estudo foi destacar como ocorrem as mudanças relacionadas à acentuação gráfica. Para isso o trabalho foi analisado de acordo com as bases que continham mudanças extremas relacionadas à acentuação. Ao longo do estudo quatro Bases foram investigadas, em cada uma a tentativa foi de sorver o essencial. Na Base VIII o estudo se deu em torno da dupla acentuação das oxítonas. Na Base IX, quatro artigos foram ressaltados, no 3º o estudo das paroxítonas que recebem dupla acentuação e nos artigos 8º, 9º e 10º a abolição dos acentos agudos e circunflexos nas paroxítonas. Na Base X a proposta era analisar a abolição dos acentos em alguns vocábulos oxítonos e paroxítonos. E na Base XI o intuito era entender como ocorre o processo de dupla acentuação nas proparoxítonas. Para  compreensão do trabalho o material utilizado foi: gramáticas e a nova reforma ortográfica. A partir do que foi apresentado o que se espera é que essa reforma, apesar de ser bastante contrastante, traga mudanças vindouras.

Palavras-chave: Reforma ortográfica. Dupla acentuação. Abolição dos acentos.


           
Ao longo da história da nossa ortografia, diversas foram às mudanças que a acentuação já passou. Desde a implantação de novas regras, o desaparecimento de algumas e a retomada de outras.
O presente trabalho tem como intuito analisar como ocorre a questão da acentuação gráfica no novo acordo ortográfico. Para isso quatro Bases serão analisadas. Na Base VIII o estudo se dá em torno das oxítonas, o uso da dupla acentuação em vocábulos terminados e ou o tônico. Na Base IX, acentuação gráfica das paroxítonas, quatro artigos são estudados, no artigo 3º a análise feita é sobre e ou o em fim de silaba seguido de m ou n. No artigo 8º o caso é a eliminação dos acentos em vogais repetidas. No artigo 9º e 10º o caso analisado também é sobre a abolição dos acentos, mas nas palavras homógrafas, distinguidas pela classe gramatical. Na Base X o artigo analisado é o 7º que trata da não acentuação das oxítonas e paroxítonas e por último na Base XI a análise feita é sobre a dupla acentuação de algumas proparoxítonas.      
            O estudo atual tenta dá uma versão renovada à reforma ortográfica de 1911, mas antes disso em 1904, ocorre à primeira manifestação de mudança ortográfica, o autor de tal feito foi o filólogo Gonçalves Viana, sendo publicada apenas, em Portugal. As mudanças privilegiavam a eliminação de alguns fonemas gregos, de algumas consoantes dobradas, de algumas consoantes nulas e a regularização da acentuação gráfica. Em 1907 a Academia Brasileira de Letras elabora um projeto, de acordo com as propostas enumeradas por Gonçalves Viana. E em 1911, Portugal oficializa com algumas modificações, o sistema do filólogo. E somente em 1915 é que o Brasil passa a adotar tais reformas, ajustadas aos moldes brasileiros pelo professor Silva Ramos. 
            De acordo com esse estudo cronológico, várias tentativas ainda aconteceram, em 1931 acontece oficialmente o primeiro acordo entre Portugal e Brasil para unir as ortografias dos dois países, que por problemas diversos não aconteceu, levando em 1943 a uma nova convenção, que em vias de tanta diferença entre vocabulários, levou a convenção de 1945, porque as reformas ocorreram em Portugal, mas no Brasil não. Somente em 1971, em Portugal, e 1973 no Brasil é que a reforma ganhou impulso, apesar de ainda existirem muitas divergências, mudanças significativas aconteceram: a abolição do trema nos hiatos átonos, a supressão do acento circunflexo diferencial nas letras e e o das palavras homógrafas e a eliminação dos acentos circunflexos e graves. Em 1975 algo decisivo ocorreu em meio a esse processo de mudança, as colônias portuguesas da África tornaram-se independentes, levando-as a participar em 1986 de uma reunião no Rio de Janeiro, juntamente com Brasil e Portugal, para a elaboração das Bases Analíticas da Ortografia Simplificada, que por várias divergências, mas uma vez não ocorreu. Nos anos que se seguiram várias tentativas ainda foram feitas, mas nenhuma conseguiu o processo desejado. E em 2008, os países lusófonos trouxeram a tona, mas um acordo ortográfico.
Algumas das mudanças feitas no novo acordo permeiam a acentuação gráfica, entre elas temos o caso da tonicidade das vogais que recebem acento, para distinção de timbre, isto é, a dupla acentuação que representa 1,27% das mudanças, cerca de (1. 400 palavras), e a abolição dos acentos agudos e circunflexos em alguns vocábulos, por conta das diferenças de pronúncia do português do Brasil e do português europeu. Apesar da tentativa de unificação, essas diferenças são os principais obstáculos para o processo de unificação entre os países lusófonos.
O acordo ortográfico propõe seis bases para o estudo da acentuação, da Base VIII até a Base XIII. Na Base VIII, parágrafo 1º ocorre à primeira análise de dupla acentuação. O estudo feito é sobre a acentuação gráfica das palavras oxítonas, orientando onde se deve usar o acento agudo e o acento circunflexo, sobretudo a dupla acentuação:

[...] Em algumas (poucas) palavras oxítonas terminadas em –e tónico/tônico, geralmente provenientes do francês, esta vogal, por ser articulada nas pronúncias cultas ora como aberta ora como fechada, admite tanto o acento agudo como o acento circunflexo: bebé ou bebê, bidé ou bidê, canapé ou canapê [...] O mesmo se verifica com formas como cocó e cocô [...] São igualmente admitidas formas como judô, a par de judo [...]. (Base VIII, 1º a, Obs.).       


            Trata-se neste artigo sobre a acentuação nas vogais tônicas abertas: -a, -e ou –o seguidas ou não de s, e traz uma particularidade quanto a acentuação das oxítonas com e tônico, que é encontrada com diferentes timbres, principalmente se provenientes do francês: bidé ou bidê; caraté ou caratê. Existe também o caso dos vocábulos terminados em o que também podem ter som aberto (agudo) ou fechado (circunflexo): cocó ou cocô.  
            Na Base IX, ocorrem também casos de dupla acentuação, o estudo se dá em torno das palavras paroxítonas. No artigo 2º a obs. Refere-se ao seguinte:


[...] Em algumas (poucas) palavras deste tipo, com as vogais tônicas/tônicas grafadas e e o em fim de sílaba, seguidas das consoantes nasais grafadas m e n, apresentam oscilação de timbre nas pronúncias cultas da língua e, por conseguinte, também de acento gráfico (agudo ou circunflexo): sêmen e sêmen, xénon e xênon; fémur e fêmur, vómer e vômer; Fénix e Fênix, ónix e ônix.     


            Algumas palavras paroxítonas com vogais tônicas, silaba forte, que tenham e e o no final de sílabas seguidas de consoante nasal, m ou n apresentam um pronúncia diferente, isto é, pode ter som aberto (agudo) e fechado (circunflexo). Essa mudança também valoriza a questão da mudança de timbre ocasionada pela divergência fonética dos países, os europeus têm uma pronúncia mais aberta, enquanto que os brasileiros possuem uma pronúncia mais fechada, e por conta de já ser consagrada na língua oficial no processo de unificação, passa a ser aceita as duas formas.       
No artigo 3º da Base IX trata sobre a não acentuação de alguns ditongos paroxítonos:


Não se acentuam graficamente os ditongos representados por ei e oi da sílaba tónica/tônica das palavras paroxítonas, dado que existe oscilação em muitos casos entre o fechamento e a abertura na sua articulação: assembleia, boleia, ideia, [...] alcaloide, apoio (do verbo apoiar), tal como apoio (subst.) [...].   

            Esse artigo discute a questão das palavras terminadas em ei e oi tônicas, que não se acentuam por possuírem uma oscilação de timbre, ou seja, em alguns casos pronunciados com sons abertos e em outros com sons fechados. Mostra também o caso dos vocábulos que tinham como facultativo o uso do acento agudo: comboio, dezoito etc., e que agora não mais se grafam com acento. E ainda o caso da não acentuação de a, e e o nas palavras paroxítonas tônicas, para mostrar a diferença de timbre: cada (â) e fada (á), para (â) e (á) tara etc.
No artigo 8º da Base IX o uso do acento circunflexo passa a ser dispensável por que: “Prescinde-se igualmente do acento circunflexo para assinalar a vogal tónica/tônica fechada com a grafia o em palavras paroxítonas como enjoo, substantivo e flexão de enjoar [...]”. (Base IX, 8º.). Segundo o acordo ortográfico torna-se dispensável por que não há razão de ser, já que as vogais repetidas apresentam a mesma pronúncia em todo o domínio do idioma, tanto na Europa como no Brasil.   
Nos artigos 9º e 10º da Base IX a questão da abolição do acento para diferenciar as palavras homógrafas persiste:


9º) Prescinde-se, quer do acento agudo, quer do circunflexo, para distinguir palavras paroxítonas que, tendo respectivamente vogal tónica/tônica aberta ou fechada, são homógrafas de palavras proclíticas. Assim, deixam de se distinguir pelo acento gráfico: para (á), flexão de parar, e para preposição; pela (s) (é), substantivo e flexão de pelar, e pela (s), combinação de per e la(s); pelo (é), flexão de pelar, pelo (s) (ê) [...].
10º) Prescinde-se igualmente de acento gráfico para distinguir paroxítonas homógrafas heterofónicas/heterofônicas do tipo de acerto (ê), substantivo, e acerto (é), flexão de acertar; acordo (ô), substantivo, e acordo (ó), flexão de acordar [...].        


Essas palavras deixaram de receber o acento agudo e circunflexo, para distinguir as homógrafas, em virtude de em Portugal desde a reforma de 1945, já ser abolido e consagrado, e por haver no Brasil algumas palavras em nosso país com caso semelhante, isto é, que não necessitam de acento para distinguir o significado do vocábulo, por serem de classes gramaticais diferentes, podem ser distinguidas pelo contexto: acerto (ê), substantivo, e acerto (é), flexão de acertar.
            A base X trata sobre a abolição do acento em u e ui tônico precedidos de g ou q nas oxítonas e paroxítonas procede-se o seguinte:


[...] Os verbos arguir e redarguir prescindem do acento agudo na vogal tónica/tônica grafada u nas formas rizotónicas/rizotônicas: arguo, arguir, argúem; argua, arguas, argua, arguam. Os verbos do tipo de aguar, apaniguar, apaziguar [...] e afins, por oferecerem dois paradigmas, ou têm as formas rizotónicas/rizotônicas igualmente acentuadas no u, mas sem marca gráfica (a exemplo de averiguo, averiguas, averigua) [...] ou têm as formas rizotónicas/rizotônicas acentuadas fônica/fônica e graficamente nas vogais a ou i radicais (a exemplo de averiguo, averiguas, [...] enxágua, enxáguam; [...]. (Base X, 7º). 


            O sumiço do acento agudo no u ocorre, segundo a norma vigente, porque o u das paroxítonas é sempre articulado, isto é, pronunciado, não sendo necessário um acento para fazê-lo ascender.  No caso das oxítonas terminadas em ui também não devem receber acento por se tratar de ditongos tônicos, que não são acentuados graficamente. Mas receberão acento se a sequência ui não formar um ditongo e a vogal tônica i formar o que ocorre em arguí – verbo na 1ª pessoa do singular do pretérito do indicativo.
            Na Base XI o acordo aborda a acentuação das proparoxítonas, inclusive a dupla acentuação: “Levam acento agudo ou acento circunflexo as palavras proparoxítonas, [..] cujas vogais tônicas/tônicas grafadas e ou o estão em final de sílaba e são seguidas das consoantes nasais grafadas m ou n, [...] acadêmico/acadêmico, anatômico/anatômico, cênico/cênico [...]. (Base XI, 3º).
Recebem acento agudo ou circunflexo as proparoxítonas grafadas com e ou o em final de silaba, seguida de consoantes nasais m ou n, pois em Portugal e nos países africanos soam com som aberto e no Brasil com som fechado. Existe porém, exceções com é caso de: cômoro e sêmola. Com a vogal a tônica como costumam referir-se, segundo o acordo, não ocorre o mesmo já seu timbre sempre fechado: ânimo, botânico etc. as exceções ficam por conta de: Dánae/Dânae e Dánao/Dânao.        
Apesar do “extremo cuidado” apresentado pelos europeus ao elaborarem o acordo ortográfico, esse processo é incoerente. Primeiro porque as mudanças só favorecem o vocabulário europeu e segundo porque as justificativas expressas para o uso da dupla acentuação e abolição dos acentos, têm a mesma justificativa, pois a dupla acentuação ocorre para que haja uma distinção de timbre entre as palavras de grafias iguais, que normalmente são faladas de formas diferentes e a questão da abolição da acentuação também ocorre pelo motivo, mas porque só abolir os acentos em alguns casos e em outros admitirem uma dupla acentuação, isso é extremamente incoerente.
Com o trabalho apresentado o que se pretende é que a ortografia apesar de complexa, passe a ser analisada com um aspecto extremamente importante para o nosso processo de ensino-aprendizagem. Pois o processo de alfabetização além da leitura também necessita essencialmente da escrita.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Acordo ortográfico da Língua Portuguesa. In Martins, Vicente. Curso de especialização em Língua Portuguesa e Literatura. Disciplina: Ortografia e o ensino do português. 2009.





* Texto elaborado a partir estudos feitos sobre o novo Acordo Ortográfico 2008, para critério de avaliação na Disciplina: Ortografia e o Ensino do Português, no Curso de Especialização em Língua Portuguesa e Literatura, da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA.  
** Graduada em Letras Habilitação em Língua Portuguesa e Suas Respectivas Literaturas pela Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA.

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