Gleiciane
Marques de Farias
O
ensino da ortografia nas escolas brasileiras, tanto da rede pública quanto
privada, tem sido motivo de preocupação por parte dos educadores. Dados
oficiais têm mostrado o agravamento no desempenho dos alunos. Provas aplicadas
por órgãos governamentais como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB),
Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica do Ceará (ESPAECE) e o Exame
Nacional do Ensino Médio(ENEM), entre outros revelam que os alunos vêm
apresentando defasagem cada vez maior, alunos que estão na quarta série do
Ensino Fundamental apresentam desempenho de alunos da primeira série. Uma das
justificativas para o desempenho insatisfatório dos alunos pode ser encontrado
na ineficiência das metodologias do ensino da Língua Portuguesa.
Analisando
a etimologia da palavra ORTOGRAFIA deriva das palavras gregas ortho (ορθο no
alfabeto grego) que significa "correcto" e graphos (γραφος) que quer
dizer "escrita", ou seja, ortografia é a forma correta de escrever as
palavras. Indo um pouco mais além a palavra
traz também uma outra carga semântica que seria “em ordem”, “ em acordo com a
Lei”. Ou seja, não é apenas a escrita correta das palavras, mas também é seguir
a Gramática Normativa, obedecer as regras que ela traz.
A
ortografia é uma invenção mais ou menos recente. Há 300 anos, línguas como o
francês e o espanhol não tinham uma ortografia. No caso da nossa língua — o
Português —, as normas de escrita das palavras, tanto no Brasil como em
Portugal, só surgiram no século XX. E vêm sendo reformuladas de tempos em
tempos. Até a reforma ortográfica de 1940, escrevíamos "pharmácia",
"rhinoceronte", "encyclopédia", "architetura"
etc. Em 1971 tivemos uma minirreforma que eliminou os acentos diferenciais
("tôrre" virou "torre") e graves em palavras como
"sòmente" e "fàcilmente".
A partir desta ideia observamos que, o estudo
da Ortografia parte do princípio que a escrita das palavras foi estabelecida
através de convenções sociais previamente estabelecidas ao longo de toda a
história e até mesmo através de acordos ortográficos como o que presenciamos
recentemente. Estudar ortografia em sala de aula passou a resumir-se em
memorização de regras, como acentuação e escrita de vocábulos, muitas vezes
fora de um contexto, o que resulta em um estudo sem valor significativo ao
estudante.
O principal objetivo do estudo da ortografia
seria o de neutralizar as variantes lingüísticas da linguagem oral para assim
evitar que cada indivíduo escreva da forma que fala, a ortografia conseguiu
conciliar o indivudual e o coletivo, criando o principio de categorização
gráfica das letras. (CAGLIARI,2002).
Segundo
o professor Artur Gomes de Morais, do Centro de Educação da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE), é preciso deixar bem claro para os alunos que
todas as regras ortográficas são fruto de uma convenção social, de um acordo
estabelecido pelos especialistas cujo objetivo é padronizar a escrita — e que,
no mundo em que vivemos, quem não domina essa convenção corretamente é
discriminado. “Por isso, não deixe a criança acreditar que vai aprender ‘na
hora certa’. Desde os primeiros momentos é papel do professor ajudá-la a
refletir sobre os erros ortográficos", afirma. "Só assim ela
internaliza as regras, que, por serem aparentemente complexas, vão desafiá-la
por toda a vida."Levando em
consideração que a população brasileira pouco lê, é então previsível que a
mesma desconheça a maioria das regras e normas estabelecidas pela Gramática
Normativa.A ortografia garante a escrita padrão, independente das variantes dialetais
existentes na linguagem.De acordo com CAGLIARI(2002) “A escola considera a
escrita como espelho da fala, esquecendo-se que o sistema de escrita é repleto
de regras gramaticais que nem sempre podem ser expressos na fala.”Diante disso
o autor afirma que a maioria dos professores alfabetizadores apresenta “uma
formação muito deficiente, o que reflete na atitudes tomadas em sala de aula” e
“somente uma boa bagagem de conhecimentos técnicos solidamente adquiridos pode
instrumentalizar o professor para resolver os problemas de cada dia, e de cada
aluno, à medida em que vão aparecendo.”
O principal objetivo da maioria das escolas em estudar ortografia se
limita apenas à memorização de regras, em saber por exemplo se a palavra é
escrita com X, S ou Ç, etc. Esquecendo-se muitas vezes em saber como chegar até
elas, onde usá-las, em quais situações: bilhetes, documentos, redações
escolares, cheques, email, enfim.
A
aquisição da correta grafia da língua escrita vem com o tempo e principalmente
com o hábito da leitura, ao longo de toda a vida construímos nosso conhecimento
linguístico, por isso mesmo, cometer “erros” de escrita é comum no processo de
alfabetização e mesmo por toda idade adulta.
A ortografia é a capacidade de o aluno
recordar palavras corretas ou formas lingüísticas socialmente aceitas. Quando a
criança erra, na verdade erra quanto à ortografia, desviando-se do modelo
estabelecido pela Gramática escolar ou pela comunidade lingüística em ascensão
social. A ortografia está pois, associada à questão de variação lingüística, às
formas de determinada classe social e, como sabemos a escrita escorreita, é uma
forma particular de escrita da classe dominante, emergente cultural e
economicamente. MARTINS (2007).
Sabemos
então que não existe um modelo pronto de como o professor pode ensinar
ortografia na escola, no entanto temos pelo menos uma dezena de métodos que não
deram certo, como o tradicional, por exemplo. Ensinar ao aluno a escrever
palavras descontextualizadas, sem sentido para o estudante, que não o faz
pensar, nem gostar da língua, muitas vezes usando até da grosseria, realmente
não foi o método mais adequado. Porém se a escola mudar a visão que tem de
ensino da Língua Portuguesa, tornando esse aprendizado atrativo, interessante,
partindo da realidade do aluno, daquilo que ele vivencia no seu cotidiano, sem
dúvida trará resultados bem mais animadores. A escola além de apenas ensinar os
alunos a ler e escrever, deve ir além, ou seja, letrar. O texto deve ser a
porta principal para inserir a criança no universo letrado, listas de palavras
de um mesmo campo semântico, histórias, lendas, contos de fadas, parlendas,
textos de jornais,etc. As crianças, jovens e adultos podem ampliar concepções e
progredir para aquisição da base alfabética, como na compreensão de outros
aspectos (a grafia correta das palavras, uso de sinais gráficos, etc.)
Os professores devem garantir que as
práticas escolares ajudem o aluno a refletir enquanto aprende e a descobrir os
prazeres e ganhos que se pode experimentar quando a aprendizagem do sistema de
escrita é vivenciada como meio para, independentemente, exercer a leitura e a
escrita dos cidadãos letrados. Para a Professora Magda Becker Soares, ser
alfabetizado vem sendo insuficiente para uma convivência realmente ativa na
sociedade contemporânea.
Ser alfabetizado, isto é, saber ler e escrever,
tem se revelado condição insuficiente para responder adequadamente às demandas
contemporâneas. É preciso ir além da simples aquisição do código escrito, é
preciso fazer uso da leitura e da escrita no cotidiano, apropriar-se da função
social dessas duas práticas; é preciso letrar-se. Se uma criança sabe ler, mas
não é capaz de ler um livro, uma revista, um jornal, se sabe escrever palavras
e frases, mas não é capaz de escrever uma carta, é alfabetizada, mas não é
letrada", explica. Para ela, em sociedades grafocêntricas como a nossa,
tanto crianças de camadas favorecidas quanto crianças das camadas populares
convivem com a escrita e com práticas de leitura e escrita cotidianamente, ou
seja, vivem em ambientes de letramento. (SOARES, 2000)
Voltando
para a Ortografia, para o ensino e aquisição da mesma como mencionado pelo
Professor Vicente Martins, o professor precisa aprender a “Ortografar
Letrando”, e isso só é possível se partir da realidade e se for prazeroso para
quem aprende. Nós educadores devemos esquecer a ideia de que as crianças
constroem sozinhas o aprendizado da escrita, é papel do professor ajudá-las a
refletir sobre os erros ortográficos, e assim construir esse aprendizado que
será realmente internalizado.
Referências Bibliográficas
CAGLIARI.
L.C. Alfabetização & Linguistica. 10
ed. São Paulo: Scipione, 2002
CAGLIARI.L.C. Ortografia na escola e na vida. In: Secretaria de Educação Básica
do Estado de São Paulo.1986. Disponivel em: http://www.alb.com.br/anais16/sem11pdf/sm11ss06_09.pdf
MARTINS, Vicente. Como ensinar ortografia sem palmatória. Disponível em: http://vicentemartins.blogspot.com/2007/06/como-ensinar-ortografia-sem-palmatria.html Acesso em: 21.Abr.2009.
MORAIS, Artur Gomes
de (org.),O Aprendizado da
Ortografia, Autêntica Ed.2002
www.rioei.org.revistaiberoamericanadeeducación . Acesso em: 21.Abri.2009. Jornal do Brasil
26/11/2000.
REVISTA Nova Escola. “É
hora de escrever certo.” 159 ed., 01/2003. Abril Editora, São Paulo-SP.
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